Ana Lacerda
A cobrana de royalties sobre a soja transgnica 714y57
30/04/2025, 08h:42 - Atualizado: 30/04/2025, 08h:49
Rodinei Crescncio/Rdnews

No mbito das cadeias produtivas que incorporam inovaes tecnolgicas, especialmente na agricultura moderna, a figura dos royalties tem ganhado cada vez mais destaque. Trata-se de remunerao devida ao titular de um direito de propriedade intelectual — seja este uma patente, marca, ou variedade vegetal protegida — pelo uso da tecnologia licenciada. No caso especfico da soja geneticamente modificada, os royalties se referem ao pagamento feito pelos agricultores pelo uso de sementes que incorporam tecnologias desenvolvidas por empresas detentoras de patentes.
Tal modelo visa recompensar o investimento privado em pesquisa, desenvolvimento e inovao, elementos que, exigem tempo, recursos e riscos. A legislao brasileira, por meio da Lei de Propriedade Industrial (Lei n 9.279/1996), garante ao titular da patente o direito de explorar com exclusividade a inveno pelo prazo de 20 anos, findo o qual a tecnologia deve ser liberada para uso pblico ir. Esse limite temporal decorre de norma legal, no caso o Art. 40, da Lei de Propriedade Industrial – LPI (Lei n. 9.279/1996), e de princpios constitucionais que orientam o equilbrio entre os interesses do inventor e os da coletividade.
Sendo assim, uma vez expirado o prazo de vencimento da proteo legal, a manuteno da cobrana dos royalties ocasiona um descomo jurdico e econmico que compromete severamente a segurana jurdica e onera indevidamente a produo agrcola nacional.
“Uma vez expirado o prazo de vencimento da proteo legal, a manuteno da cobrana dos royalties ocasiona um descomo jurdico e econmico que compromete severamente a segurana jurdica e onera indevidamente a produo agrcola nacional” 42338
A persistncia dessa prtica, em um setor como o da soja, cujo ciclo produtivo extremamente sensvel a variaes de custo, capaz de gerar obstculo direto competitividade do produtor rural brasileiro, mais ainda se considerados os elevados custos operacionais dos cultivos, como o caso do Estado de Mato Grosso, consolidado entre os maiores produtores de soja em escala global.
Nesse prisma que o Supremo Tribunal Federal – STF firmou o entendimento, em anlise Reclamao n. 56.393, segundo o qual indevida a exigncia de royalties sobre a tecnologia Intacta RR2 PRO (biotecnologia para soja que oferece resistncia a lagartas e tolerncia ao herbicida glifosato) aps a expirao da respectiva patente.
Frise-se que o precedente estabelecido pela Corte Suprema tem a capacidade de reverberar para alm do caso intrnseco Reclamao, mas pode desestimular condutas semelhantes em outros segmentos do agronegcio em que esteja ocorrendo a cobrana de royalties vinculada a patentes com prazo j expirado ou em questionamento. Tal repercusso positiva no se limita, portanto, soja, mas ao conjunto do setor agrcola que adota biotecnologias licenciadas.
A deciso, nesse cenrio, refora o princpio da boa-f objetiva nas relaes comerciais, exigindo mais transparncia na precificao das sementes, alm de recolocar o Estado — por meio do Judicirio — na figura de garantidor do respeito s normas constitucionais e legais que regulam a inovao, sem que esta se converta em instrumento de dominao econmica ou perpetuao de lucros injustificados.
Diante disso, tem-se que a deciso do STF transcende os limites formais do litgio objeto da Reclamao, ela sinaliza sociedade brasileira que o avano tecnolgico no campo deve coexistir com a observncia estrita ao Estado de Direito, ao respeito funo social da propriedade intelectual e proteo do produtor rural — este ltimo, no raro, o elo mais fragilizado na engrenagem do agronegcio, mas paradoxalmente o mais essencial para sua existncia.
Ana Lacerda advogada do escritrio Advocacia Lacerda e escreve exclusivamente nesta coluna s quartas-feiras. E-mail: [email protected]. Site:www.advocacialacerda.com